Dr. Henrique Radwanski
Há 20 anos, na edição de janeiro 2004 da revista FORUM, foi publicado um artigo de grande relevância para a história da restauração capilar. De autoria de Richard Shiell, um dos fundadores da ISHRS, The Okuda Papers é o resultado de uma verdadeira operação de investigação que percorre mais de 60 anos através de dois continentes. Este artigo coloca o nome de Shojui Okuda no topo do pódio do pioneirismo no transplante de cabelo.
Quase nada se sabe deste médico japonês. Por duas razões, seus extensos trabalhos de pesquisa sobre o cabelo não tiveram nenhuma repercussão na literatura mundial. Em primeiro lugar, seus experimentos e estudos clínicos, repletos de informações detalhadas, foram escritos em velho kanji, uma forma antiga pictográfica de japonês, de difícil interpretação. Com mais de 50 páginas originais, quando o trabalho foi finalmente traduzido para o inglês, chegava a mais de 200 páginas. Em 2º. lugar, sua data de publicação, no Japão, foi extremamente infeliz. Foi aceito pela Japanese Journal of Dermatology and Urology em 1939, véspera da 2ª Guerra Mundial.
Dr. Shiell soube destes estudos pioneiros quando viajava pelo Japão em 2003. Lá conheceu os escritos do Dr. Okuda pelo colega Kenichiro Imagawa. Entretanto, tampouco ele conseguia ler o original, e foi ajudado pelo seu pai, Dr. Yoshiro Imagawa, que então passou o manuscrito do velho kanji para um inglês impecável. E foi assim que o mundo reconheceu, finalmente, Dr. Okuda como o pioneiro da cirurgia capilar. Alguns anos mais tarde (1959) Dr. Norman Orentreich de Nova Iorque, publicaria seus trabalhos clínicos, utilizando muitas das ideias e instrumentos do seu antepassado japonês. Não há, entretanto, nenhum registro de que Orentreich tivesse conhecimento do que havia sido escrito; então, trata-se aparentemente de uma afortunada sincronia.
The Okuda Papers consistiam em cinco seções, e seu conjunto foi publicado na revista asiática com o título Clinical and Experimental Study of Living Hair Transplantation. As seções descreviam: 1]. Experimentos clínicos no cabelo vivo 2]. Estudos histológicos após transplante 3]. Estudos experimentais com homoenxertos e heteroenxertos em animais 4]. Resultados histológicos em animais 5]. Pesquisa de alterações nervosas pós-transplante de cabelo. Na 1ª. parte, o autor dá crédito a vários precursores que pesquisavam transplante de cabelo e que foram esquecidos: Schweininger (1875), Tieffenbach (1882), Thiersh, Eisenberg, Krause (1896), Reverdin, Devis, Takahashi entre outros. Okuda descreve o uso de uma “serra arredondada” que nada mais é do que um punch afiado. Utilizava de diferentes diâmetros: 1 – 4 mm, observando que quanto menor, maior o risco às raízes do cabelo. Notou que, invariavelmente, enxertos entre seres diferentes eram sempre rejeitados num período de até três semanas, deixando uma área cruenta. Ele também descreveu o que fundamenta a cirurgia de restauração capilar: os folículos são área-doadora dominantes. Ao fazer transplante, em vacas, de pelos brancos sobre área de pelos pretos, o fio transplantado não mudava de cor.
Por infeliz circunstância, os trabalhos minuciosos e detalhados do Dr. Okuda não foram reconhecidos em vida. No Congresso da ISHRS em Chicago, 2015, do qual participei, houve uma cerimônia muito simbólica em homenagem ao Dr. Okuda. Com a presença de seu neto, Dr. Takahiko Okuda, nosso estimado colega Dr. Paco Jimenez fez uma bela apresentação dos trabalhos deste verdadeiro pioneiro, prestando um devido tributo aos The Okuda Papers. Ao final, o auditório inteiro levantou-se para um longo aplauso.